ENTREVISTA COM DR. ALDO MEDEIROS
Nas últimas semanas, o Centro Acadêmico Amaro Cavalcanti/Direito UFRN entrevistou o Presidente da OAB/RN, Dr. Aldo Medeiros, para conhecer um pouco da sua história, suas opiniões pessoais acerca da conjuntura e sobre como ele chegou até o tão importante cargo de direção da Seccional do Rio Grande do Norte na Ordem dos Advogados do Brasil. Veja:
- Quem é Aldo de Medeiros?
Eu sou daqui do Rio Grande do Norte, nasci no Seridó, em Parelhas, e vim morar em Natal com 11 anos de idade; inicialmente, estudando na casa de parentes, depois que minha família também veio para cá. Eu fiz, inicialmente, a graduação de Economia, fiz o vestibular na UFRN, completei 1 ano no curso e depois me transferi para o Rio de Janeiro. Alguns anos depois de formado, voltei ao RN, fiz o vestibular novamente na UFRN e me formei em Direito.
Eu já trabalhava como economista, numa empresa pública, mas mudei para a área de Direito, já que me empolguei com o curso. Eu tinha um certo preconceito contra as carreiras jurídicas, mas me empolguei, fui aluno de Jales Costa, ele foi uma pessoa que moldou minha forma de ver o Direito, em razão disso procurei mudar não só da empresa que trabalhava para o quadro de advogados, como também exercer a área jurídica como minha principal atividade profissional. Pouco tempo depois, surgiu um concurso para a Procuradoria Municipal de Natal, eu fiz e fui nomeado logo nas primeiras nomeações, além disso, montei um pequeno escritório particular com 3 colegas de classe (por diversos fatores, os três seguiram caminhos distintos, mas todos tiveram muito sucesso na advocacia), assim que me formei, de modo que exerço a advocacia há 35 anos, tanto na forma pública, como na forma privada. Acabei vindo para essa função, que eu considero extremamente honrosa, que é a de presidir a seccional da OAB.
- Qual foi a época na qual o senhor esteve no curso de direito da UFRN? Como era o ambiente político do curso nesse período? E a atuação do Centro Acadêmico Amaro Cavalcanti?
Era uma atuação bem forte [do Centro Acadêmico], porque nós estávamos na época da Redemocratização. Eu me formei em julho de 1986, o regime ainda era militar, mas já estava em fase de migração para a Redemocratização, discutia-se muito a anistia, ampla geral e irrestrita, a questão da Constituinte; eu fiz Direito Constitucional e fui aluno do professor Paulo Lopo Saraiva, do professor Ney Lopes de Souza, da professora Suzana, e sempre se estudava o Direito Constitucional já projetando a certeza de que as bases constitucionais seriam redefinidas por uma Constituinte, que, à época, se defendia a convocação, ela ainda não havia sido convocada. Foi uma época muito rica, em que nós ficávamos divididos com a ideia de que estávamos estudando aquilo e que, provavelmente, numa nova Constituição, grande parte do arcabouço legal, infraconstitucional, teria que ser totalmente redefinido, por conta do que viria em uma nova Constituição, que foi a [Constituição] Cidadã de 1988.
- Como foi a sua trajetória acadêmica? O senhor sempre quis advogar?
Eu faço parte de um grupo em extinção, que é daquelas pessoas que entram no curso de Direito só querendo advogar. Como eu já era economista, tinha muito claro, na minha mente, que se eu tivesse que mudar do curso que exercia para uma carreira jurídica, era para advogar, tanto que só fiz concursos para duas carreiras que possibilitam a advocacia paralela: a Procuradoria Municipal e a Procuradoria do Estado, mais ou menos na mesma época.
Eu sempre quis somente advogar, o que é uma raridade, principalmente aqui no Nordeste, que é onde a economia é mais combalida e as pessoas buscam, na carreira pública, uma segurança que não têm na carreira privada, ou então que é muito mais difícil no ramo privado; eu gosto muito de advogar, como já falei, me empolguei com a advocacia nas áreas do curso de Direito. Eu não podia participar muito ativamente dos projetos extraclasse, porque eu já trabalhava, já era casado e tinha um filhinho, e eu estudava algumas disciplinas pela manhã e outras à noite, de forma a poder acelerar um pouco o curso (não ficar atrasado), mas havia uma atuação bem firme. Lembro muito de alguns colegas que tinham uma atuação bem orientada, no sentido da Redemocratização do país.
- Depois da UFRN, o senhor teve uma longa trajetória, como advogado e procurador até chegar no cargo de honra que é a presidência da OAB/RN. Como foi receber essa responsabilidade tão grande?
Eu costumo dizer que as coisas não são assim tão programadas por mim. Eu tenho uma linha de ação, eu acho que a pessoa que vai pra uma guerra só ganha medalha se tiver na linha de frente, então eu sempre encarei com muita disposição os desafios que se apresentavam a mim. Isso me fez ter algumas oportunidades.
Logo no início, quando entrei no quadro dos procuradores do município, eu fui, em torno de 1 ano e meio depois, já fui procurador geral do município por 2 anos e alguns meses, eu exerci praticamente todas as chefias lá, o que mostra que eu nunca me apeguei a alguma coisa e não procurei uma zona de conforto. Estou citando isso como uma opção por estar sempre correndo atrás das coisas. E isso fez com que eu me deparasse com situações que eu nunca programei. Por ser economista, eu sempre achei que fosse ser um tributarista, ou trabalhar com direito empresarial, no entanto surgiu uma oportunidade para que eu organizasse o IBDFAM, que é o Instituto Brasileiro de Direito de Família no Rio Grande do Norte, e eu resolvi organizá-lo para depois passar adiante para uma outra pessoa, e me envolvi também no direito de família de forma que fui fundador no Rio Grande do Norte, fui diretor, presidente, sou até hoje membro.
Então as coisas foram acontecendo e nunca veio de forma detalhada esse pensamento de que eu vou me envolver no direito de família ou eu vou lutar para ser presidente da OAB. A presidência da OAB surgiu em duas oportunidades. Na época eu era vice-presidente, e quando eu era vice-presidente eu fui indicado por alguns colegas para ser o representante da chapa de situação, mas não se viabilizou essa candidatura e eu disputei a candidatura pela oposição e não fui eleito. E fiquei 6 anos afastado da OAB porque achei que a minha oportunidade seria aquela, até que uma nova oportunidade surgiu com um grupo de advogados, eu acho que estava adivinhando essas dificuldades todas que nós estamos passando, com certeza a pandemia não, mas esse momento de dificuldade de diálogo. As pessoas agora não dialogam, não argumentam, se insultam, são radicais, e isso é muito difícil, e numa carreira como a nossa que nós somos acostumados a dialogar uns contra os outros, sempre nesse enfrentamento, as coisas se exacerbaram.
E aí um grupo de colegas me procurou para que eu voltasse a concorrer, porque precisavam de alguém que tivesse pelo menos uma certa vivência na propositura do diálogo, uma perseverança que eles enxergavam em mim, hoje eu já tenho até dúvidas se é possível alguém atravessar essa fase tão difícil. Enfim, foram oportunidades que surgiram e que eu assumo e vou com bastante dedicação, procurando fazer o melhor possível.
Eu tenho meus princípios que são princípios democráticos, eu sou uma pessoa conhecida como uma pessoa do diálogo e acho muito interessante ter essa característica nesse momento, eu tinha uma relação muito boa com meus alunos, mas chega um momento que você cansa de trabalhar três expedientes, eu passei a vida inteira trabalhando três expedientes, então eu tive que deixar uma das atividades, deixei a universidade, num segundo momento me afastei do outro campo e foi assim que recebi essa missão de ser presidente da OAB.
- Como o senhor vê a atuação da OAB junto ao curso de Direito da UFRN? Temos cerca de 15 projetos de extensão e todos eles agregam parte do alunado do curso.
Nós temos um bom relacionamento. Havia um certo afastamento por falta de comunicação, mas acho que agora nessa gestão nós temos uma ação nossa, no ano passado tivemos uma restituição orçamentária muito forte e esperávamos ter feito um trabalho bem consistente para o equilíbrio econômico e tínhamos conseguido, mas agora com essa pandemia não sabemos o que vai acontecer com as finanças. Estamos sempre caminhando juntos, temos vários projetos em que a OAB é participativa, o Capitólio, a revista In Verbis, tem outros projetos que nós participamos e temos interesse em continuar assim e até aprimorar ainda mais.
- Qual era a sua relação com o CAAC, enquanto estudante, e como o senhor vê essa parceria no contexto da OAB?
Eu tinha uma parte das disciplinas de manhã e outra à noite, mas eu tinha uma aproximação com os dirigentes do CAAC, até hoje, o atual vice-governador, Antenor Roberto, era dessa época; Marcos Dionísio, que já faleceu, era conhecido como “mosquito”, eu tinha uma amizade muito grande com ele e com outras pessoas que também eram envolvidas no Centro Acadêmico. O foco na época era a redemocratização e a anistia. Eram bandeiras extremamente democráticas e que somavam muito à unidade de ideias e interesses. Mas isso nos separa 40 anos de realidade. Eu não sei bem qual é a realidade hoje. Me lembro bem quando cheguei na OAB, logo após a eleição, o presidente Paulo Coutinho me disse “Aldo, esqueça a OAB que você conheceu até 6 anos atrás, isso aqui hoje é uma outra realidade”, então eu imagino que há uma outra realidade também hoje nos cursos de direito e na universidade, de forma que eu não saberia dizer agora “eu proponho tal coisa”. Ao contrário: eu gostaria de ouvir as opções, que vocês pudessem apresentar que opções nós poderíamos trabalhar em conjunto, e terá todo um interesse de nossa parte de participar e desenvolvermos algo comum.
- Como o senhor vê o cenário que o país vive de tantos ataques à democracia, como os protagonizados pelo governo Bolsonaro, que inclusive chegou a atacar diretamente o presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz?
O presidente atual, ele tem.. eu não diria uma patologia, mas me parece que ele tem algum tipo de desvio, que faz com que ele esteja diariamente criando dificuldades para todos nós, para o país e para a sua direção, e eu não vejo equilíbrio nas atitudes do Presidente da República e acho que ele está sempre escolhendo bodes expiatórios. Então, a agressão que ele fez ao pai de Felipe Santa Cruz gerou uma dificuldade para toda a advocacia, porque Felipe Santa Cruz, como toda pessoa de bom caráter, saiu em defesa da memória do pai. Até porque era uma injustiça o que estava se dizendo é uma mentira histórica. Com isso, gerou uma dificuldade que o Presidente da República transferiu para toda advocacia. Então me preocupa muito, acho que o presidente não está agindo com sensatez, e que nós no Brasil vamos pagar um preço, estamos já pagando um preço muito complicado em razão disso.
Ping pong
– Um livro
Cem anos de Solidão
– Um escritor
Eu continuo lendo cada vez mais José Lins do Rêgo, porque a minha realidade do interior é muito forte.
– Uma música
Música é o meu ponto mais frágil, eu não sei cantar nenhuma música, mas gosto muito, por uma questão muito particular, de “La Belle de Jour”.
– Uma viagem inesquecível
A viagem que fiz com a minha família para a Itália.
– Um filme
É um filme antigo, que se chama Dersu Uzala, é sobre um caçador que vive solto na floresta e que no fim da vida é obrigado a ficar na cidade.
– Um ídolo
Eu sou uma pessoa meio descrente, eu não consigo pensar em alguém assim.
– Um sonho
Eu tenho um sonho de me aposentar e ficar muito bem sentado lendo meus livros e assistindo meus filmes, mas quero fazer isso depois dos 90 anos, porque eu quero trabalhar enquanto for possível. Eu acho que quando você para de trabalhar as coisas se precipitam.
- Por fim, que conselho o senhor daria para os estudantes que ainda estão no curso?
Se preparem para inovar. Esqueçam o exemplo de advocacia que vocês conhecem, ou por alguém da família ou por uma pessoa que vocês sempre admiraram. A advocacia vai ter que se renovar totalmente, a realidade é outra, o mundo é outro, não existe mais aquela advocacia tradicional de você ficar no seu escritório e o cliente trazer a causa até você, infelizmente isso não existe mais. E digo mais, tão importante como saber processo civil, processo penal e direito material, é saber tecnologia da informação. Hoje em dia é muito comum os advogados dedicarem mais tempo à parte tecnológica dos seus processos do que à elaboração das peças e ao próprio trabalho em si, por isso vocês saem com uma vantagem, que foram criados nesse ambiente já mais forte na tecnologia, mas isso é muito importante.
- Considerações Finais
Me sinto muito honrado porque a Universidade Federal é realmente o nosso berço, nós todos tivemos oportunidades muito importantes na nossa formação e eu sou muito de reconhecer as coisas, então eu me sinto muito em casa quando vou à Universidade tratar de qualquer coisa. Me senti muito cobrado no momento em que vi que a Cooperativa Cultural está pedindo para que as pessoas comprem vouchers para depois transformar em livros, isso são coisas que me tocam assim como uma coisa da minha casa. Fiquei feliz por saber que poderei ser um exemplo de alguém que passou por aí e tenho alguma contribuição a dar.